Foto: Paul Popper, Popperfoto/Getty Images, restaurada via IA

TALENTO, INJUSTIÇA E DESEQUILÍBRIO

por Bruno Assis

Técnico, inteligente e eficiente na criação das jogadas. Futebol elegante e que driblava com desprezo e suavidade. Costuma tirar o pé nas divididas, corria dos trancos mais duros e das jogadas de contato. Alguns diziam que ele pipocava!

Mas com a bola dominada em seus pés, era um deslumbre. Batia falta como ninguém, chute seco e cheio de curva. Barbarizou Jairo, arqueiro corinthiano, com dois chutaços idênticos em cobranças de falta.

No Náutico formava a “trinca de ases” com Juca Show, Vasconcelos e Jorge Mendonça. Esse time impediu o hexa do até então imbatível em Pernambuco: Santa Cruz.

Em 1974, aos 20 anos, Jorge Mendonça já brilhava pelo Náutico. Em uma partida contra o Santo Amaro pelo Campeonato Pernambucano, marcou todos os gols dos 8 a 0 do Náutico. Não era centroavante, mas mostrava claramente o faro de gol.

O sucesso do trio foi tanto, que o Palmeiras contratou Vasconcelos e Jorge Mendonça. O primeiro chegou com pompa de craque, como possível substituto de Ademir da Guia. O segundo veio um pouco mais tímido.

O futebol do Vasconcelos não tinha nenhuma semelhança com o do Divino (pudera?!). Era um futebol mais rápido e de passes curtos. Aquela pausa “Divinal”, liderança e os lançamentos precisos não eram características do atual camisa 10. Ele posteriormente iria para o Chile defender o Palestino, onde viraria ídolo.

O Jorge Mendonça não era tão sacro quanto a divindade “da Guia”, mas havia uma magia distinta naquele homem. Gostava de carregar a bola, arrancava quando precisava, driblava e finalizava como poucos. Além de tudo, cabeceava precisamente.

O Palmeiras foi campeão paulista em 1976 e o Jorge Mendonça foi artilheiro do time e a estrela da companhia. O último título alviverde que depois amargaria 17 anos sem caneco.

Apesar desse seu destaque, havia ainda motivo de críticas ao jogador. Enquanto sobrava arte em seu futebol, faltava raça sem a bola.

Um dos pontos altos de sua carreira, foi Cláudio Coutinho preterindo Zico (que conhecia muito bem) em favor de Jorge Mendonça na Copa da Argentina.

No ano de 1979, o técnico do Palmeiras era Telê Santana, que formou um meio de campo com Pires e Mococa fazendo a retaguarda para Jorge Mendonça voar. Foi o que de fato ocorreu no Maracanã derrotando o timaço do Flamengo de Zico e cia por 4 a 1. Com participação nos quatro gols.

Só não foi campeão brasileiro porque havia o invicto Internacional no caminho, apesar de ter jogado melhor que os gaúchos, a equipe de Falcão levou a melhor.

Havia uma sintonia entre Telê Santana e Jorge Mendonça, os estilos e a filosofia de jogo. Sem medo de atacar, buscar o gol, ousar acima do medo. Mas Telê era discípulo de Zezé Moreira, e herdou tanto a maestria quanto a teimosia.

Jorge Mendonça era o malandro criado em Bangu, na escola do bicheiro Castor de Andrade. Vedete e rebelde. Artilheiro sensual, de cortes precisos e tabelas área adentro. Não gostava de treinar, achava que não precisava. Para ele era muito simples… “Rola bola que eu me garanto”. Telê não conseguiu domesticá-lo, havendo até bate-boca. A corda estourou do lado do meio campista.

Foi vendido para o Vasco da Gama, que o comprou para fazer dobradinha com Roberto Dinamite, repatriado do Barcelona e outro perseguido por Telê. A dupla não deu certo.

Socialmente, o Rio de Janeiro não fez bem para Jorge Mendonça, “quebrava” todas as noites, comprometendo-se financeiramente e fisicamente.

Sai da “Cidade Maravilhosa” e embarca em Campinas para defender o Guarani. Chegava para fazer dupla com o centroavante Careca.

Pelo Guarani, em 1981, foi artilheiro do campeonato paulista com 38 gols, é o único jogador depois da era Pelé, a marcar mais de trinta vezes em um Paulistão

Foi artilheiro do Brasil no ano de 1982, e o técnico da seleção, Telê, vingou-se! Levou o meio campo do São Paulo, Renato “Pé-Murcho”, como reserva imediato de Zico.

Não ir para Copa de 82 era puro capricho do treinador. Jorge Mendonça estava voando como um dos grandes destaques do futebol brasileiro naquele tempo. Disse até que jogaria aberto como falso 7, caso Telê quisesse. Não teve acordo…

Esse foi talvez o golpe mais duro sofrido em toda sua carreira. Porque a partir dali, seu interesse pelo futebol foi definhando junto com sua saúde.

Jogou depois pela Ponte Preta, Rio Branco/ES e no Colorado/PR. Cada ano que passava, mostrava apenas uma imagem pálida daquele jogador cheio de vida.

Seu corpo forte foi emagrecendo, passou a beber excessivamente, gastou o que tinha e o que não tinha.

Acabou-se a alegria daquele homem sorridente, futebol de peladeiro, irreverente. Foi abatido pelo alcoolismo. Caiu no profundo ostracismo. Decadência sem fim. Ia pelos bares com algumas fotografias antigas no bolso mostrando quem ele era, ou havia sido… Morreu no ano de 2006 por um ataque cardíaco.